Cuidado, Alma! - comentário

Um dia, trabalhando numa Escola de Educação Infantil como Psicóloga, estava na minha sala escrevendo documentos e, de repente, uma da aluna de 5 anos, coloca a cabeça pra dentro da sala e pergunta: "Tia Fabi, o que que é alma?". Confesso que fui pega de surpresa, naquela vida corrida de adulto, preenchendo papelada, fazendo diversas coisas... e do nada, BUM: Uma pergunta tão simples e tão complexa! 


Tive que parar e organizar meus pensamentos no tempo recorde de 5 segundos, enquanto a buscava na porta para ficar mais perto e, então explicar algo tão delicado. Usei pouco da teoria aprendida na faculdade, e muita dose de poesia, de carinho, de desenhos infantis... E de alma, para poder explicar a pergunta daquela pitoca tão curiosa. Perguntei primeiro de onde havia surgido essa pergunta ( já sabia que sua mãe havia morrido, alguns meses atrás). Ela me respondeu o seguinte: 

"É que algumas pessoas disseram que a alma da minha mãe continua viva e que apenas o corpo morreu. Eu posso ver ela? Eu posso falar com ela? Mas afinal, o que que é alma?" E aí foi uma explicação, falando dos sentimentos, falando do amor, e com o máximo cuidado de não criar a ilusão que ela poderá ver a mãe outra vez, porque era isso que ela pensava.

Já paraste para pensar que justificamos a ausência de pessoas queridas com a presença de suas almas? Então, porque alguém perderia sua alma, quando ainda está aqui?

Quando vi o vídeo, as primeiras coisas que chamaram a atenção foram: o consumismo, a criança que andava sozinha pelas ruas, o roubo da alma. Ainda tinha que falar da música que nós, facilmente estimulados por sua suavidade, nos colocamos com aquela cara fofa esperando as "peripécias" de Alma. Até que, de um segundo para outro, tudo muda. Aparece a ansiedade e a perturbação. Algo que era tão simples para algo tão forte.

Eu pensei em muita coisa... No consumismo: louco, endoidando as pessoas. Eu repensei sobre os roubos de alma. Eu ainda penso na criança que estava sozinha. 

Sobre o consumismo: Pessoas na busca constante por algo, "algo que tenha a cara do grupo que eu vivo, algo que esteja na moda, algo que me faça sentir parte de algo, o corpo perfeito, o dinheiro...". Que algo é esse? A busca constante no exterior. Já vi muita gente virar boneca. Gente bonita que fica feia. E não falo de beleza física, falo da beleza de ser, simplesmente, uma pessoa feliz. E não várias (pessoas=grupo). 

Falo disso porque não vejo alegria quando as pessoas alcançam aquilo que queriam. Não estou, de maneira alguma, levando a bandeira do "não consumismo", não é isso. Estou, apenas, levantando uma faixa de alerta para aqueles que precisam daquele "algo" para ser feliz. Da dependência: se tenho isso, estou feliz. Bonecas deste mundo louco, que não se permitem um pouco de paz se não a constante busca do que (não) existe fora.

Sobre a solidão das crianças: quando falo em criança, a coisa é mais delicada. Respeito os pequenos e os escuto com toda minha atenção. Sei o quanto é importante o olhar para uma criança, nem que seja para transmitir o simples "estou aqui". O famoso Bullying nada mais é que o grande sintoma social da falta do olhar e respeito às crianças. No meio deste turbilhão mundial elas nascem sem pedir e, muitas, crescem pedindo, pedindo tudo. Pedindo atenção. Em quase todos os pedidos é apenas atenção que elas querem. Sem isso elas ficam presas. Presas a bonecas, presas a deboches de amigos, presas a falta de olhares.

Os apelidos, as brincadeiras com as crianças, sempre existiram. Mas antes elas sabiam se defender. Desde cedo estavam na rua jogando, pulando, batendo figurinha, aprendendo a ganhar e perder. Agora elas ficam nos computadores, sem convívio social, e a primeira piada que escutam na escola, desmorona o pequeno ser. (outra vez: os computadores são essenciais, mas como tudo: dose moderada. E sim, as escolas tem que estar mais atentas aos alunos, assim como os pais. O bullying sempre existiu, mas tem piorado, e é a esse crescimento que me refiro :)

O mundo mudou e muda muito rápido.  
E nessa jogada, alguns se perdem.
Aqueles que conseguiram salvar a criatividade e o olhar: compartilhem e dividam! O mundo precisa disso!
As crianças precisam disso!
Cuidado, Alma! 

Fonte da terceira imagem


Essa é apenas uma das mil maneiras para interpretar este curta :)

18 comentários:

  • bixudipé | 18 de junho de 2011 às 11:34

    Fantástico o blog; já sou fã.

    Abração.

  • Hellen Caroline | 18 de junho de 2011 às 13:02

    Fabi,
    Perfeito!
    Retrata bem uma realidade triste e cruel,onde o brincar não é mais tão falado,e o computador é o único prazer.Quando se dão por si,a vida já passou e já terão de enfrentar a realidade cara a cara sozinhos.
    Que possamos mudar ou ajudar a alterar isso!
    Ps: eu amei o vídeo do Cuidado,Alma...tão lindinho :)
    Beijo

  • Ale | 18 de junho de 2011 às 14:23

    E alma é uma coisa que pergunta pra alma, se a alma existe

    -Quintana

  • MA FERREIRA | 18 de junho de 2011 às 15:54

    Poxa..li tudinho..sem respirar..ou quase sem respirar..
    Seu texto é maravilhoso.
    Fala de muitas coisas que precisamos ficar atentos.
    O ser humano acha que é um corpo que possue uma alma.
    Eu acredito ao contrario. Sou uma alma que estou temporariamente num corpo.
    Se estou aqui, neste corpo provisório preciso cuidar dele e não ser escravo dele.
    Preciso me preocupar em ser..ao inves do TER.
    Digo sempre pra minha filha: para sermos felizes não precisamos seguir nenhum rebanho.
    Preciso sim, ter o poder de dicernimento para distinguir se o rebanho vale a pena ser seguido ou não.
    A verdade liberta.
    Para sermos livres temos que ser verdadeiros.
    E como alma, somos perfeitos.
    Se algumas "cascas" foram aderidas ao longo de nossa jornada, com um pouco de esforço podemos tira-la .. e assim voltarmos a ser o SER completo, que colabora, que serve, que ouve e que é gente que sente.

    Um bj..
    Ma

  • Fabi | 18 de junho de 2011 às 20:19

    @Bixudipe: Seja bem vindo! Gostei te sua última no postagem no blog.

    @Hellen, Ale, Ma: realmente é triste tudo isso. As crianças estão tendo suas infâncias roubadas. Me dói fundo ver uma criança assim, nestes "caminhos blogueiros" um dia me deparei com o blog de um menino de 15 anos que dizia no "quem sou eu": "sou alguém que passa 24 horas na frente do computador, odeio falar com as pessoas, sofro de bullying no colégio, meus pais nem sabem que eu existo"
    Eu pensei: que triste, quantas crianças vivem assim... e quantos pais não se dão conta que seus filhos passam 24 horas no computador e não tem um amigo, mas tem 11.000 seguidores no Twitter (este é o dado do mesmo menino). Pra onde vamos? Nao sei, só sei que eu estou ainda, focando na simplicidade, na alegria, na criatividade, ainda escuto e acredito que as crianças tem muito a ensinar e acredito nas pessoas... e sim, uso o computador para ampliar meus conhecimentos e contatos, mas não me resumo a ele. A informática pode ser essencial ou prejudicial... é como tudo na vida... demais ou de menos... temos que estar atentos.
    beijo pra vocês!!

  • MARILENE | 18 de junho de 2011 às 21:05

    Você fez uma clara e excelente explanação da matéria. Não acredito que se deva dizer a crianças sem capacidade de entendimento que a alma foi embora.
    Antigamente, esses apelidos eram coibidos por uma atuação mais rigorosa dos professores, mas hoje eles estão limitados e, por qualquer razão, ainda podem sofrer processo. O mundo mudou, mas muitas novidades de hoje ainda não são usadas adequadamente. Sem contar a falta diálogo e a internet, mais presente que a família.

    Espero que vença seus obstáculos com a justiça. Nunca aceito brindes, por essa razão. Se mandam, entro logo em contato, por escrito, e guardo cópia.

    Bjs.

  • AquilesMarchel | 19 de junho de 2011 às 07:52

    blog digno de seguir
    bom demais... texto fantastico...
    o mundo precisa disso!

  • dade amorim | 19 de junho de 2011 às 17:51

    Fabi,foi muito bom descobrir este blog, ler o que você tem a dizer, que é tanto e tão necessário às crianças e aos pais, professores e colegas, aos adultos que lidam com elas.

    Beijo e muito sucesso em seu trabalho.

  • Vera Lúcia | 19 de junho de 2011 às 21:02

    Fabi,
    Achei fantástica a explanação de seu entendimento. Confesso que eu estava curiosa para conhecer o seu posicionamento a respeito do vídeo.
    Naquele momento, não alcancei todo esse entendimento. Tudo que você colocou é muito verdadeiro e , realmente, pode ser extraído do curta.
    Beijokas.

  • xxxxx | 20 de junho de 2011 às 04:11

    Ai que fofo!

    Adorei aqui. Vou seguir.

    PS: Bem vinda ao Blog da Michele

    Um beijo,
    Mih

  • bixudipé | 20 de junho de 2011 às 07:26

    Fabi - permite-me chamá-la assim? - que texto esplêndido. Que visão criteriosa. Adorei a forma objetiva e leve como "descascou" o tema.
    Talvez, tendencioso ao tema que abordei em Bixudipe, remeti este excelente curta a influência que a mídia exerce sobre nós, e com mair força nas "menores mentes" - as crianças.

    Abração.

  • MARILENE | 20 de junho de 2011 às 11:40

    Obrigada pelo esclarecimento. O que estranho é a ameaça, pois bastaria que me comunicassem, com identificação. Já que algumas são pagas, poderia até pagar por elas, se valesse a pena.

    Bjs.

  • MARILENE | 20 de junho de 2011 às 20:33

    Você foi extremamente gentil e lhe sou muito grata. Quem sabe já está rsolvido? Mas não recuso a oferta, se precisar, grito SOCORRRRRRO !!!

    Bjs.

  • Poeta Insano | 21 de junho de 2011 às 19:01

    Olá Fabi!

    Lendo seu texto, pude ver uma pessoa
    sensível, dando uma explicação complexa a uma
    também sensível criança.
    E complementando com fatores importantes aos
    quais não poderíamos deixar de notar em nossas
    crianças, dando-lhes sempre total atenção.
    E seu texto me fez recordar de um momento vivido:

    Numa tarde, fui à padaria no intervalo de
    meu trabalho buscar três pães, como é de
    costume. Levei apenas umas moedas, pois minha
    intenção era comprar apenas os pães.
    Na porta da padaria haviam dois meninos,
    entre 8 e 10 anos,
    distribuindo propaganda com desconto para
    um circo que estava na cidade.
    Disseram-me que em troca, eles podiam assistir
    aos espetáculos. Então, sugerí à eles que
    além de distribuir os ingressos, ajudassem
    na limpeza básica do circo, assim podendo
    receber um dinheirinho em troca do serviço.
    Eles gostaram da idéia e me agradeceram.
    O mais velho pediu se eu tinha umas moedinhas
    para dar a ele, então disse-lhe que havia trazido
    apenas dinheiro para comprar três pãezinhos,
    mas que poderia dividir com eles, então comprei
    um para cada um de nós.
    O mais velho novamente disse:
    _Tio, dá essas moedinhas que sobraram pra mim?
    E o mais novo rapidamente retrucou!
    _Não mano, é pra ele comprar o pãozinho dele amanhã!

    Confesso que perdí o chão dos meus pés naquele momento,
    ao ver que com toda dificuldade em que vivem aqueles meninos
    ainda conseguiram se preocupar comigo.
    Claro que dei-lhes as moedinhas que sobraram, e disse-lhes
    que não se preocupassem, que no dia seguinte eu me viraria.

    E percebí que não fui eu quem fez uma boa ação por
    aqueles meninos, e sim, eles que fizeram por mim.

    Desculpe por ocupar teu espaço.
    Um abraço!

  • Jeferson Cardoso | 23 de junho de 2011 às 10:39

    Sensacional a sua crônica! Eu estava em um passeio aos blogs quando aqui entrei por acaso e tive a grata felicidade de deparar-me com sua crônica. Gostei muito! Parabéns pelo texto, Fabi! Abraço!

    Convido para que veja e comente o meu Armelau no http://jefhcardoso.blogspot.com/

    “Que a escrita me sirva como arma contra o silêncio em vida, pois terei a morte inteira para silenciar um dia” (Jefhcardoso)

  • Carol Pimenta | 23 de junho de 2011 às 21:07

    Poxa Fabi...grande alcance sobre o curta...te confesso que estou vendo e revendo ele...e me inspirando para comentá-lo, hehehehe

  • Fabi | 24 de junho de 2011 às 00:58

    @Ana, @Jeferson: Obrigada!! Que bom receber a visita de vocês!!
    Beijo!

    @Carol Pimentinha: quero te ver logooo!! que saudade, amiga querida!! :)